Poucos autores poderiam alegar terem sido tão seminais para a história do mangá quanto Osamu Tezuka, o proverbial manga no kamisama: o “Deus do Mangá”. Responsável por uma vasta biblioteca de títulos, e por uma série de personagens ainda hoje icônicos, este estudante de medicina tornado mangaka é não poucas vezes apontado como grande responsável pelo mangá moderno.
Tezuka, porém, não brotou da terra com lápis em uma mão e papel na outra, já o melhor em sua arte. É preciso tempo para que alguém atinga a divindade, afinal. Sendo assim, neste artigo eu quero falar um pouco sobre uma das primeiras obras de sua carreira, um título que inclusive veio a se tornar tão mítico quanto o seu criador: Shin Takarajima.
E aos que se interessarem, o mangá foi lançado no Brasil pela editora New Pop, e pode ser encontrado para compra pela Amazon.
Foi em 12 de abril de 1945 que chegou aos cinemas japoneses Momotaro: Umi no Shinpei(Momorato: Sacred Sailors), que com 74 minutos de duração viria a se tornar o primeiro efetivo longa metragem japonês em animação. A bilheteria do filme, porém, não seria das melhores. Como nos conta o The Anime Encyclopedia, 3rd Revised Edition: A Century of Japanese Animation, nessa época as crianças já haviam sido evacuadas das cidades em direção às áreas rurais, ao passo que os adolescentes eram convocados para o trabalho nas fábricas. Estamos, afinal, em plena Segunda Guerra Mundial. A rendição alemã ainda levaria algumas semanas, ocorrendo em maio daquele ano, ao passo que a guerra em si só chegaria ao fim dali a cinco meses, em setembro de 1945.
A influência da guerra sobre o filme, porém, certamente não termina na sua bilheteria. Momotaro: Umi no Shinpei é o que se costuma chamar de um “filme propaganda”, e seu principal financiador foi ninguém menos que o Departamento de Informação da Marinha Imperial Japonesa. Nada de novo, é lógico. Arte propaganda foi e ainda é uma constante em qualquer guerra – e mesmo fora dela. Basta lembrar que foi em 1943, apenas dois anos antes, que a Disney lançou o curta Der Fuehrer’s Face, onde o Pato Donald vive uma terrível experiência como trabalhador do regime hitlerista, apenas para acordar e, ao se dar conta de que era apenas um pesadelo, agradecer a boa sorte de ser um cidadão americano. E esse curta ganhou um óscar.
Momotaro: Umi no Shinpei não foi o único anime propaganda que o Japão fez ao longo da Segunda Guerra, mas por seu tamanho fazê-lo um marco da animação japonesa ele acabou sendo o mais lembrado e o mais comentado. Sendo assim, vamos dar uma olhada nesse filme, dos seus antecedentes até o seu legado.
Tentando algo um pouco diferente. Eu quero também tentar trazer para o canal conteúdos que vão além das indicações e análises de sempre, então aqui um primeiro teste nessa linha. A questão de qual foi o primeiro anime da história é uma até que bastante complexa, mas acho que consegui deixar claro o meu ponto [rs]. Em todo caso, vejam ai o vídeo e espero que curtam o/
Kitayama Seitaro é um nome que provavelmente não irá ressoar com lá muitos leitores – isso se com algum. Mas nascido na Tóquio de 1888, em 1917 Kitayama se revelaria um dos três pioneiros da animação japonesa, ao lado de Shimokawa Oten e Kouchi Jun’ichi. Cada um lançaria sua primeira animação para os cinemas naquele ano, e seguiriam produzindo diversos outros curtas que deram o pontapé inicial na industria da animação no Japão – antes dela aparentemente entrar em um hiato de cinco anos para só vir a ressurgir em 1924.
Infelizmente, praticamente tudo desse período inicial se perdeu. A Wikipedia mantém uma página sobre animes anteriores a 1939, e dedica uma seção apenas às obras de 1917 e 1918, com praticamente todas as obras aqui listadas sendo dadas como perdidas, de localização desconhecida, ou até mesmo de existência incerta. A única exceção para o ano de 1917 é o curta de Kouchi Jun’ichi Namakura Gatana. 1918, porém, aparenta ter três exceções, na forma de três curtas do próprio Kitayama.
A coisa, porém, é um pouco nebulosa. Segundo a página, Momotaro, presumivelmente baseado no mito de Momotaro, sobrevive intacto, mas eu não realmente consegui encontrar nenhuma confirmação disso (muito menos, claro, o curta em si). Idem valendo para o curta Taro no Banpei Senkotei no Maki, do qual teoricamente sobrevive um fragmento, mas novamente me falta ainda localizar qualquer fonte confiável que corrobore isso, que dirá então o fragmento em si.
Se perguntados qual teria sido o primeiro anime para a televisão, os poucos que se aventurariam a responder talvez citassem a adaptação do mangá homônimo de Osamu Tezuka, Tetsuwan Atom (Astro Boy), que foi ao ar em 1963. Mas enquanto esse anime estabeleceu precedentes importantíssimos que viriam a definir a industria pelas décadas seguintes, fato é que as animações japonesas já haviam ingressado na televisão alguns anos antes, na forma de alguns curtas de um único episódio ou de centenas de comerciais animados.
Há, porém, um caso curioso dentre esses animes que precederam Tetsuwan Atom. Trata-se de Instant History, do estúdio Otogi Pro, que leva o título de primeiro anime seriado da televisão japonesa. Com episódios curtinhos, de apenas alguns minutos, a animação contava o que havia ocorrido “neste dia na história” através dos olhos de um personagem que descobria a resposta por si mesmo. O primeiro episódio foi lançado em 1961, e a série ficou no ar até o ano seguinte, 1962. Nesse ano, ela mudou de canal e de nome: da Fuji TV ela passou para a TBS, e de Instant History ela passou a se chamar Otogi Manga Calendar, nome pelo qual é mais conhecida hoje.
Em 2017 os animes completam 100 anos de existência, ou ao menos é o que nos diz o site Japanese Animated Film Classics. O site foi criado pelo Centro Nacional de Cinema, do Museu Nacional de Arte Moderna de Tóquio, em comemoração a essa data. O propósito do mesmo é o de streaming de filmes clássicos da animação japonesa, sobretudo aqueles produzidos entre as décadas de 1920 e 1940, e segundo notícia do Anime News Network o site deve ficar no ar apenas até o final deste ano.
A data obviamente não foi escolhida ao acaso: 1917 foi certamente um ano seminal para os animes. Enquanto Katsudo Shashin demonstra que experimentos com a mídia já ocorriam há um tempo, 1917 foi o ano em que a animação japonesa efetivamente chegou ao cinemas, e isso graças ao trabalho pioneiro de três indivíduos que viriam a ser conhecidos como os “pais” do anime: Shimokawa Oten, Kitayama Seitaro e Kouchi Jun’ichi. Infelizmente, porém, quase tudo dessa época se perdeu.
Muito do que sabemos sobre os anos iniciais da animação japonesa vem de fontes secundárias. No melhor dos casos encontramos notícias da época anunciando a exibição de um ou outro filme, ao passo que em situações menos favoráveis só podemos contar com os relatos daqueles envolvidos na produção dos filmes, relatos estes muitas vezes dados décadas após o lançamento efetivo dessas animações. Há, porém, duas exceções notáveis, uma das quais sendo o primeiro filme de Kouchi Jun’ichi, Namakura Gatana.
Quando começa a história da animação japonesa? Qual foi, afinal, o primeiro anime? Essa é uma pergunta que muitos fãs da mídia já devem ter se feito, mas infelizmente ela também é uma sempre em aberto. Durante muito tempo acreditou-se que as primeiras animações japonesas datavam do comecinho de 1917, quando temos os primeiros desenhos animados japoneses feitos para o cinema. Em 2005, porém, um curta de apenas três segundos jogou as origens do anime para algum tempo antes, e a história da animação japonesa ganhou aqui um novo capítulo – ou, talvez seja mais apropriado dizer, um novo prefácio.
O curta em questão foi encontrado por Matsumoto Natsuki, especialista em iconografia da Universidade de Artes de Osaka, motivo pelo qual o curta é algumas vezes chamado de fragmento de Matsumoto (embora seja uma obra completa, não um fragmento). Apesar de encontrá-lo em janeiro de 2005, foi apenas em agosto daquele ano que notícias sobre “o anime mais antigo da história” começaram a circular pelo mundo. O jornal Asahi Shimbun fez uma matéria sobre o curta em 1º de Agosto, e no dia 7 foi a vez do site Anime News Network publicar a respeito dele. E desde essas primeiras divulgações a antiguidade do curta já estava evidente, com ele sendo colocado como provavelmente do final da era Meiji, que se encerrou em 1912.