[Vídeo] Não é ruim, mas também não é bom | Futari wa Pretty Cure


Yin e Yang em forma de anime.


Roteiro:

Fossemos listar as franquias mahou shoujo de maior sucesso, seria difícil não colocar Precure bem próximo do topo. Tendo sua primeira encarnação em 2004, novas séries são lançadas numa base praticamente anual ainda hoje, numa longevidade invejável. E conforme séries de mahou shoujo se voltam para um público mais velho, Precure se firma como referência absoluta de seu gênero dentro daquele espírito mais infantil – e comercial – que deu origem ao mesmo.

Justamente por esse histórico, já tem algum tempo que tenho certa curiosidade para com a franquia. Em especial para com a primeira série, afinal foi ela quem deu início a tudo isso. E eis que a oportunidade me apareceu! Algumas pessoas num grupo no facebook do qual participo deram a ideia de um Clube do Anime de Futari wa Pretty Cure, onde assistiríamos e comentaríamos a série episódio a episódio. Sabem, tipo as rewatches do r/anime?

Então lá fomos nós, imaginando que seria uma experiência bastante agradável. E bom, pra ser justo, até que foi, só não bem pelos motivos que imaginávamos. E o resumo da ópera é exatamente como eu coloquei na tumbnail desse vídeo: é um péssimo mahou shoujo, mas um bom slice of life. E o resto desse vídeo vai ser a versão longa dessa frase.

Após assistir os 49 episódios da série original, esta é a minha review de Futari wa Pretty Cure.

Então, a primeira coisa que precisa ser mencionada aqui é que atualmente a franquia precure é bastante conhecida pela sua animação de alta qualidade e lutas com boa coreografia. E tendo assistido aos dois primeiros episódios da série mais recente, Star Twinkle Precure, eu posso dizer que a fama é merecida. Infelizmente, ela não se carrega para o passado. Como eu disse, Futari wa Precure é bem ruinzinho como mahou shoujo, e praticamente toda a culpa disso está nas suas batalhas.

Pequeno resumo da história, apenas para dar o contexto. Certo dia, Nagisa e Honoka acabam conhecendo Mepple e Mipple, enviados do Jardim da Luz que possuem a missão de proteger duas das sete Prism Stones e de encontrar as lendárias Pretty Cure. Conforme os mascotes contam, o Jardim da Luz havia sido atacado pelo Dark King, a encarnação da escuridão e supremo regente da Dusk Zone, a fim de obter as Prism Stone, as Pedras da Criação. Ele conseguiu cinco, mas os dois fugiram com as duas últimas, e agora precisam do poder das Pretty Cure para recuperar as pedras roubadas e salvar ao Jardim da Luz e à Terra.

Logo no primeiro episódio as duas garotas são confrontadas pelo Pissard, um enviado do Dark King, que invoca a sombra Zakkenan e faz com que esta possua os brinquedos de um parque de diversões. Esta será essencialmente a fórmula das lutas durante a primeira metade do anime: aparece o capanga, ele invoca o Zakkenan, as garotas acabam com o Zakkenan e o capanga foge para voltar outro dia. Nada de muito inovador, mas certamente nada de estranho também, então onde está o problema. Sigh, por onde eu começo…

Vamos lá, primeiro de tudo, a animação de Futari wa Pretty Cure é mediana em seu melhor e bem ruinzinha em seu pior, o que resulta em lutas bem pouco impressionantes visualmente. A repetição de quadros é constante, mesmo dentro de um mesmo episódio. Fora que a coreografia não ajuda, em alguns raros momentos sendo inclusive difícil de entender o que diabos está acontecendo na tela.

Mas acho que o maior problema aqui é simplesmente a repetitividade. Não só os episódios seguem uma fórmula fixa, mas também as próprias lutas são bastante formulísticas. Quase sempre a mesma sequência de socos contínuos e chute do alto antes das garotas se darem conta de que seus ataques não estão fazendo efeito e decidirem então usar o seu movimento assinatura: o Precure Marble Screw durante a primeira metade da série e o Precure Rainbow Storm durante a segunda metade.

Pra ser franco, é uma fórmula bem preguiçosa, que inclusive deixa algumas perguntas no ar. Por que elas nunca tentam ir direto com o Marble Screw? Por que os vilões simplesmente fogem mesmo quando é o Zakkenan que foi derrotado, e não eles próprios? Por que os vilões não lutam eles próprios desde o começo, ao invés de insistir em usar o obviamente mais fraco Zakkenan? Por que quase ninguém tem o bom senso de simplesmente dar um passo pro lado e desviar desse raio de energia que só faz ir pra frente? Por que quase ninguém tenta manter as duas separadas, de forma que não possam usar seu golpe assinatura?

Sendo justo, há instâncias em que isso é feito, e o último confronto contra a Poisonee, outra dos enviados do Dark King, é um excelente exemplo. Não apenas ela desvia do primeiro Marble Screw como ela ainda ativamente busca manter as garotas separadas. Isso não só gera uma boa desculpa para as duas precisarem recorrer ao combate físico, como ainda também as força a pensar fora da caixa e a bolar estratégias e outros meios de usar seus poderes. É uma ótima luta, e pena que demora tanto até algo do tipo acontecer novamente.

Ah sim, e fora todos os problemas mencionados, o anime ainda tem a bizarra mania de dar poderes aos personagens que são então sumariamente esquecidos logo no episódio seguinte. Tipo o Pissard transformando os visitantes de uma exposição em pedra, ou a Poisonee criando um mundo de espelhos, ambos poderes que vemos em um episódio e depois nunca mais.

Até as garotas têm a sua versão desse problema. Durante o que podemos chamar de segundo arco do anime, quando Pissard já foi derrotado e o capanga principal da vez é o Gekidrago, temos a introdução do ataque Pretty Cure Rainbow Therapy, usando em criaturas vivas para tentar purificá-las da possessão pelo Zakenna. O problema é que o golpe é usado umas três vezes na série inteira, se tanto. O que é uma pena, já que havia potencial aqui. Seria muito legal se as garotas tivessem um pequeno arcabouço de poderes com funções variadas, e tivessem de ser criativas com o que usar e quando.

Por exemplo, em uma luta as garotas confrontam um par de armaduras que as lendas dizem terem pertencido a guerreiros que disputaram a mão de uma jovem. Ao invés de usar o Marble Screw, como seria de se esperar, as garotas usam o Rainbow Therapy, estando implícita ai a premissa de que não estavam lutando com meros objetos inanimados, mas com os espíritos daqueles guerreiros. Infelizmente, esse um episódio é o mais longe que o anime vai com o conceito.

Agora, eu imagino que para alguns todas essas críticas soem como nitpiking. Então a animação não é das melhores, então há algumas inconsistências e incoerências no roteiro, e daí? No final todos nós sabemos o porquê de tudo isso: é um anime pra crianças, e um que precisa manter uma fórmula semi-episódica enquanto durando o tempo que precisa durar, tanto ao nível do episódio quanto ao nível da série. Mas como eu já disse antes algumas vezes, ser “para crianças” não é, e nem deveria ser, uma desculpa para ser ruim, ou para um roteiro preguiçoso. E pelo menos no que tange ao seu lado mahou shoujo, Futari wa Pretty Cure é irritantemente preguiçoso.

Mas, se você ainda se lembra do que eu disse no começo do vídeo, ainda que seja um péssimo mahou shoujo, onde Futari wa realmente brilha é no seu lado slice of life.

Cada episódio do anime funciona com uma primeira metade contando o dia a dia das crianças e uma segunda metade onde temos a luta contra o inimigo da semana. Sobre essa segunda parte vocês já ouviram o bastante, mas falemos agora um pouco sobre a primeira.

Para começar, Nagisa e Honoka são personagens interessantes, além de bem divertidas. Elas seguem ainda o velho trope tomboy e girly girl, mas com lá suas particularidades.

Nagisa é jogadora de lacros. Atlética, não muito boa nos estudos, mora com os pais e o irmão mais novo num apartamento, e está constantemente aplicando golpes de luta livre no seu irmãozinho pentelho. Honoka, por outro lado, é uma cientista mirim, filha de pais milionários que passam o ano fora a trabalho, e por isso vive com a avó e seu cachorro numa casa tradicional japonesa.

Externamente, as garotas não poderiam ser mais diferentes uma da outra. E mesmo em personalidade elas têm suas peculiaridades. Ainda assim, as duas se dão bem quase que imediatamente, Nagisa inclusive sendo, fica implícito, a primeira garota de sua sala que a Honoka se sente confortável chamando de “amiga”. Enquanto diferentes em diversos aspectos, os valores das duas são até que bem parecidos, nutrindo forte afeição uma pela outra e pelas pessoas ao seu redor, além de um senso de justiça e dever que, bom, seria o esperado de um mahou shoujo, né?

Os demais personagens do elenco, enquanto não tão desenvolvidos ou caracterizados, ainda são carismáticos a seu modo, e alguns recebem lá um ou dois episódios de foco para mostrarem um pouquinho mais de si próprios, de modo que pouco a pouco vamos nos familiarizando com aquela sala, aquela escola, e aquela cidade. As duas garotas que gostam de fazer fantasias. A “Maddona” do colégio”. A vendedora de takoyaki. O interesse amoroso da Nagisa e suas duas amigas, uma das quais tem a curiosa mania de sempre repetir a mesma coisa três vezes. É um mundo bem mais “vivo” do que eu esperaria de uma série de tipo.

Muito ajuda também como aqui nós temos uma variedade muito maior de cenários, literal e figurativamente. Vemos as garotas andando pelos diferentes meandros da cidade, tendo de resolver pequenos problemas e dilemas como um jogo importante ou uma feira de ciências. Enquanto toda luta parece idêntica a anterior, seria difícil encontrar nesse anime dois momentos de slice of life que lembrem um ao outro. Quase me faz perguntar como a mesma equipe tão sem imaginação para o combate conseguiu produzir tanto no que diz respeito ao dia a dia dessas meninas.

Chega a ser engraçado, e mesmo um tanto quanto irônico. Digo, o anime claramente usa e abusa da ideia de yin e yang. A paleta de cores das garotas, o fato de terem personalidades e interesses quase que opostos, o ataque assinatura delas sendo uma literal espiral preto e branca… Que o próprio anime seja tão consistentemente uma mescla quase que em perfeito balanço de partes boas e ruins soa quase que apropriado, por frustrante que seja.

O que me leva então à pergunta decisiva. Depois de tudo isso que eu disse, eu recomendo ou não Futari wa Pretty Cure? É complicado de responder isso, porque ainda que quando o anime seja bom ele seja realmente muito bom, quando ele é ruim ele é realmente muito ruim. Mas depois de muito deliberar, eu acho que vou ter de concluir com um não, eu não recomendo. Bom, ou pelo menos não para a maioria das pessoas.

Se você tem curiosidade de saber como essa franquia começou, então vá em frente. Ainda que não tenha me maravilhado, eu não consigo dizer que me arrependo de ter assistido esse anime. Mas para qualquer outra pessoa… Se você quer dar uma chance à franquia, existem pontos de entrada bem melhores. Se só quer assistir outro mahou shoujo, também há títulos bem melhores. Mesmo se for pelo slice of life, o que não faltam são séries do tipo por ai, que pelo menos não vêm com uma metade de lutas sem sentido.

Futari wa Precure não é ruim. Mas ele também não é bom.

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